CRÍTICA
- Hora Incerta
- 30 de jul. de 2020
- 6 min de leitura
Atualizado: 10 de ago. de 2020

O movimento Black Lives Matter expandiu-se e tornou-se um movimento mundial pela justiça penal, igualdade de direitos das minorias, contra a violência policial, antirracista e que reflete sobre privilégio branco globalmente estabelecido. Ganhou novamente destaque no presente ano de 2020 num manifesto pela justiça após a morte de George Floyd. Mas esta é uma luta transversal a todos os períodos da história. Como tal, devemos contribuir para que esta ganhe voz diariamente enquanto a justiça social não for cumprida.
O Hora: Incerta compromete-se a ser um lugar de lutas e de justiça e, por isto, organizamos uma seleção de filmes e livros através dos quais te poderás informar melhor sobre injustiças sociais embutidas na história, com premissas racistas e manifestos do privilégio branco para que assim percebas melhor o significado e a força deste movimento, e reflitas no que podes também tu acrescentar-lhe.

O primeiro passo que podemos dar em apoio ao movimento é pormo-nos no lugar do outro e consequentemente apelar à nossa empatia através da informação, por isso,propomos-te um conjunto de três obras cinematográficas, todas em exibição na Netflix, dirigidas por Ava DuVernay. Nascida na Califórnia, tornou-se a primeira mulher afroamericana a ganhar o prémio de melhor direção, com a longa metragem “Middle of Nowhere” no Festival Sundance de Cinema de 2012 e também a primeira diretora negra a ser nomeada para um Globo de Ouro e a ter um filme nomeado para o Óscar de Melhor filme com o “Selma: Uma Luta pela igualdade”.

“Selma: Uma Luta Pela Igualdade”: retrata as batalhas de Martin Luther King Jr. (representado eximiamente por David Oyelowo), ativista dos direitos pela igualdade racial, que ganhou o Prémio Nobel da Paz em 1964. Foca-se na sua vertente humana, no entanto, apresentando-o, contrariamente a outras bibliografias como um homem tático e não tanto emocional, enquanto personalidade política que é. O momento de destaque deste filme é o retrato de um momento histórico da luta de Luther King que, apesar de não muito mediático, foi de extrema importância: as marchas de Selma a Montgomery, no Alabama, pelo direito do voto aos cidadãos negros. Este foi um momento de conflitos políticos dentro da militância negra, governo e protestantes, fortemente marcado por episódios de abuso de violência polícia estatal com o objetivo de controlar os manifestantes. É, por isto, um filme que retrata um episódio da humanidade em 1965, mas que se assemelha a diversos casos de violência policial com índole racista que diariamente sucedem nas diversas partes do mundo. O filme apresenta planos cinematográficos incríveis, apelando ao detalhe sensorial através de diferentes luzes, cores e planos, com um ritmo de clímax bem explorado em conjugação com a sonoridade ambiente necessária. Destacam-se os diálogos entre Luther King e o presidente Lyndon B. Johnson, (representado por Tom Wilkinson), onde, através do seu poder persuasivo, o ativista político pressiona o presidente a aplicar a lei que dá o direito de voto aos negros. E ainda os inúmeros diálogos políticos emancipados por pessoas de fé em tom de sermões e dentro de espaços religiosos, onde o pastor protestante Martin Luther King lutava pelos direitos das minorias sociais, quase como um paradoxo entre a religião cristã usada como uma ferramenta política e a política de sermão que se posiciona quase como uma religião.

“When They See Us”: Minissérie estadunidense, baseada numa história real, de cinco adolescentes negros de Harlem condenados injustamente por uma violação de uma mulher no Central Park. A série está dividida em quatro episódios que expõem as falhas do sistema racista de Justiça dos Estados Unidos através do caso “The Central Park Five”, percorrendo a trajetória de Antron McCray, Kevin Richardson, Yusef Salaam, Raymond Santana e Korey Wise, desde os primeiros interrogatórios em 1989 até à absolvição em 2002 e ao posterior acordo de indeminização realizado em Nova Iorque em 2014. No final dos anos 80, momento histórico em que a série se passa, sucediam em Nova Iorque inúmeros casos de violação por resolver. Nesta mesma altura uma jovem foi violada e abandonada às portas da morte no Central Park, onde nessa noite dezenas de jovens se encontravam. Dado o contexto social, as autoridades estavam pressionadas a encontrar respostas para esta violação e iniciaram a investigação partindo do suposto que teria sido o aglomerado de jovens reunidos no parque, levando a prestar depoimento cinco jovens, dos quais quatro eram menores de idade e todos cumpriram penas entre os 6 e os 11 anos de prisão. Um dos aspetos mais marcantes desta série é a forma como as autoridades, forçam e manipulam estes adolescentes a acusarem-se mutuamente e a admitirem um crime que não cometeram , através de mentiras sobre diminuição das suas próprias penas, quase como se não houvesse outra saída, para que no fim os condenem baseando-se nestas testemunhas que os jovens dão na tentativa de se salvarem. É também realçada a posição de defesa das penas de morte por parte de Donald Trump, que condicionou também o desenrolar da investigação. Deste modo, é fácil o espectador prender-se ao desenrolar da história, sentindo raiva pelos jovens, cuja vida lhes foi roubada e alterada de modo permanente e os momentos de liberdade que lhes foram arrancados enquanto adolescentes, tudo somente pela cor da sua pele num sistema judicial racista.

“13º EMENDA”: Documentário que aborda a discriminação racial não através da visão redutora do racismo como o resultado de falhas do comportamento individual de cada um de nós, mas sim através de um panorama mais abrangente, que atribui à estrutura social responsabilidades, nas formas de propagação e reprodução de práticas com índole racista. O nome escolhido é também a personificação do objetivo pretendido na criação destes 100 minutos de informação relevante e perturbadora, pois a 13º Emenda da Constituição, que prevê o fim da escravidão e a liberdade para todos os cidadãos, faz uma ressalva para pessoas que cometeram crimes, prevendo para os criminosos, uma vida de escravidão perante o Estado. Abordando de forma cronológica a maneira como o racismo, nos Estados Unidos, se constitui e perpetuou propositadamente através das classes dominantes, o documentário revela a trajetória da população negra no pais e o modo como esta representa um reflexo de interesses conservadores no enclausuramento em massa e na exploração econômica das prisões privadas, através da mão de obra prisional como fonte primária de trabalho em inúmeras fábricas.
Como reflexo do preconceito enquanto imagem propagado pela indústria do cinema, o documentário iniciasse com imagens do filme” O Nascimento De uma Nação” (1915), que perpetua a perceção dos negros enquanto seres selvagens, agressivos e ladrões. Através de entrevistas e de uma agilidade documental notável, utilizando conceitos de fácil compreensão para o público em geral, somos levados a compreender a existência de fenómenos escondidos pelos média e a forma com esta realidade continua a existir atualmente, pois embora o racismo tenha sido oficialmente abolido, o governo tem recriado novas formas de associar a população negra à criminalidade e de estender as penas aos jovens, existindo, deste modo, números desproporcionais de indivíduos negros nas prisões subjugados pela maioria branca do Congresso e do Senado. Todo o documentário é representado de forma racional através de números e estatística, numa defesa socioeconómica dos argumentos, sendo o lado emocional retratado nos minutos finais, notório na frase proferida por um ex-presidiário, que sintetiza a mensagem principal: “Nós, que somos extensões desta opressão, não precisamos de ver imagens para saber o que está acontecendo. Imagens servem para falar com as massas que têm ignorado esta realidade durante a maior parte de suas vidas”. Também os professores e pesquisadores convidados nos são apresentados, não de forma erudita, mas através de uma cinematográfica neutra, onde apenas os seus ideais se destacam e não o contexto. DuVernay, abrange, nestas documentárias, opiniões divergentes quer políticas de esquerda e direita, quer entre a própria comunidade negra, gerando complexidade e diversidade no debate. Construindo um projeto polémico, mas urgente, que levanta o pano a muitas questões, que até então não tinham voz, o seu maior objetivo é a sensibilização das pessoas, para que, através da arte, se abra um debate de questões, capaz de causar transformações sociais. Como refere na sua entrevista a Oprah Winfrey, também em exibição na Netflix, esta é uma realidade que também ela vivenciou de perto e sente-se no dever de contribuir para que futuras gerações possam viver sem ditaduras impostas pela cor de pele.
- por Filipa Eleutério -1 de Agosto 2020 em Críticas, Cultura
Acho que a visão que têm do BLM, é muito superficial.
Vidas Negras importam, este movimento Pro-Black não!
Queremos reforma da polícia, não a morte da polícia.
Vídeos que secalhar mudarão a vossa ideia deste movimento:
https://youtu.be/uFSfGHFH1J8 / https://youtu.be/0xcB6fNZBeM.