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Saúde Mental: O vírus para o qual ainda não há vacina

  • Foto do escritor: Hora Incerta
    Hora Incerta
  • 18 de fev. de 2021
  • 8 min de leitura

Está tudo bem contigo? Hoje não pareces estar bem…!


Passa-se alguma coisa? Estás com algum problema?


Pareces triste, queres falar?


Pareces diferente, podes desabafar comigo, se quiseres!


Tantas perguntas, tão diferentes e a resposta é quase sempre a mesma: “Estou bem, não te preocupes”. Uma resposta que não convence mas que é consentida. Como se inquiríssemos a outra pessoa, já sabendo, à partida, qual seria a resposta e, por isso, quando a recebemos, não questionamos, nem sequer nos damos ao trabalho de insistir, porque sabemos que a vergonha de ambos os lados não permite uma conversa aberta sobre um tema, ainda, tão tabu quanto a saúde mental.


A invisibilidade é algo que nos deixa a todos desconfortáveis, por alguma razão, construímos uma vida assente em bens materiais que vão sendo adquiridos e que são palpáveis. Por alguma razão, vivemos no século onde a imagem se sobrepõe à palavra, onde a aparência ganha à realidade e onde parecer é mais importante que ser. Já para não falar do tempo, uma das poucas coisas que nos é dada como infindável, mas que nas últimas décadas passou a ser escassa. Não há tempo para parar, não há tempo para pensar, não há tempo para olhar para o mundo, para a vida, para as pessoas, não há tempo para olhar para o outro, seja esse “outro” quem for.


Agora, a dúvida que se instala é a seguinte: quando estamos com dores de garganta, quando partimos uma perna, quando nos é diagnosticado uma doença que nos faz perder a mobilidade, a força ou a capacidade de falar, dirigimo-nos a um hospital, a um posto médico ou uma clínica, onde é-nos feita uma avaliação para podermos ser acompanhados e assim minimizar os efeitos do diagnóstico, quer através de medicamentos, operações ou fisioterapia. A dor é incontrolável e quando a sentimos, sabemos que está na altura de procurar ajuda médica. Fazemos isto, desde que nos lembramos. Fomos ensinados assim e isso está muito presente até na forma como a sociedade trata alguém que está fisicamente debilitado. Não nos podemos esquecer é que além do corpo, existe uma ferramenta crucial nas nossas vidas e que por sinal condiciona a nossa saúde física e psicológica – a mente. Mas voltamos ao princípio, a mente, este tão complexo compartimento que faz parte de nós, é invisível, os pensamentos são guardados e muitas das vezes menosprezados por quem os tem, ao ponto de os esconder com vergonha que sejam expostos e por isso alvo de julgamento por parte de quem os rodeia.


Desde há muitos séculos atrás, que a sociedade tem tendência a catalogar as pessoas, conforme as suas características físicas e psicológicas, os seus comportamentos, as suas atitudes, a sua forma de estar, de falar, de vestir, no fundo a forma como vivem. Atualmente, estamos inseridos numa sociedade altamente competitiva, onde não importa o caminho, mas sim se os objetivos impostos pela própria sociedade são ou não alcançados pelo indivíduo. Somos confrontados diariamente com uma realidade individualista e egoísta que é alimentada pela forma como somos educados. Caímos na tentação, constantemente, de nos esquecermos que para lá da vida profissional, social e pessoal, há um ser humano. Um ser humano que se confronta diariamente com os seus dilemas interiores. “Só sirvo para arranjar problemas”, “ Não sou aquilo que esperavam que eu fosse”, “Este não é o meu caminho”, “A minha vida não faz sentido”, “Sou um peso para todos”. Se há algum problema em ter estes pensamentos? A resposta é: talvez. É do conhecimento de todos que a vida tem fases boas e outras não tão boas, tem momentos em que pensamos ser os melhores e outros em que consideramos estar ao nível dos piores. Tudo isto faz parte, aliás, estes pensamentos são parte integrante do crescimento intelectual e emocional de cada um. Mas, como já referi, a forma como lidamos com estas questões, que invadem o nosso pensamento e, em última instância, podem vir a limitar a forma como vivemos, é o ponto-chave desta questão.


Somos todos diferentes e é preciso aceitar isso. Não caiamos no erro de nos comparar, de querer ser melhor que o outro, de querer ser mais do que aquilo que somos, como se a nossa vida dependesse disso. Se há quem consiga libertar-se destes pensamentos e encontrar dentro de si o equilíbrio, há também quem o queira fazer há anos e por mais que tente não consegue. As razões por que não consegue, pouco importam aqui. A sociedade portuguesa e os portugueses devem unir-se e criar condições para que a saúde mental não seja um tabu, muito pelo contrário para que a saúde mental seja tão ou mais valorizada que uma consulta de rotina junto do médico de família. É urgente perder o medo, a vergonha, a culpa e dar um passo em frente.


A depressão é uma doença do foro psiquiátrico que afeta aproximadamente uma em cada cinco pessoas no mundo. A depressão está associada a fatores sociais e psicológicos que podem ser consequências, mas também causas da mesma. A ansiedade, a angústia, a tristeza e a irritabilidade são os principais sintomas desta doença, contudo quando diagnosticados a tempo podem ser travados pela própria pessoa através de uma mudança de hábitos ou rotinas, que privilegiem a saúde mental e o bem-estar emocional. No entanto, o que acontece na maioria das vezes é um agravamento desses sintomas e o aparecimento de outros, tais como: a apatia, a falta de vontade e a baixa autoestima. Mas estes não são os únicos, alguém que se encontra num estado depressivo é, também, afetado por sintomas físicos, como por exemplo: cansaço extremo, sensação de corpo pesado e pressão no peito, entre tantos outros. Por diversos motivos, ainda, hoje, esta doença é silenciada pela sociedade e por isso chega a tomar proporções dramáticas na vida de quem já foi ou ainda é vítima da mesma. Em casos extremos, a pessoa encontra-se de tal forma desesperada, sem qualquer sentido ou rumo para a vida que começa a desenvolver na sua mente pensamentos suicidas que, infelizmente, chegam mesmo a deixar de ser só pensamentos e a pessoa acaba por pôr termo à própria vida.


2020 foi decerto o ano em que mais se falou em saúde mental. 2020 foi ano em que todos (ou quase todos) percebemos que a saúde mental importa. Foi o ano em que mudámos as nossas vidas (todos sem exceção) não por vontade própria, mas por que fomos obrigados a tal. Sem alternativa, ficámos fechados em casa e 24 horas sobre 24 horas vivemos só connosco, com pensamentos, medos, desejos, sonhos que são apenas e só nossos. Mas talvez tenhamos todos muito mais em comum do que pensamos. A covid-19 trouxe-nos os mesmos medos, as mesmas dúvidas, as mesmas perguntas às quais nunca obtivemos resposta concreta, o que intensificou ainda mais o clima de incerteza em que vivemos. Talvez nos tenhamos unido nisso, porque somos todos vítimas deste vírus e, por isso, estamos todos a passar pelo mesmo processo, se bem que com algumas diferenças pelo meio. Esta sensação de que estamos todos a fazer a mesma viagem, no mesmo mar, com o mesmo destino, provavelmente em barcos diferentes, mas a ultrapassar as mesmas tempestades, as mesmas marés e os mesmos dias de sol, dá-nos a certeza de que somos todos iguais ou que pelo menos estamos todos “a falar a mesma língua”.


A pandemia teve um impacto muito forte na vida dos estudantes. Um estudo feito por psiquiatras do Hospital Júlio de Matos em março de 2020, concluiu que os estudantes com mais de 18 anos são um dos grupos mais afetados com as medidas de isolamento social. Este estudo sobre o impacto do isolamento social na saúde mental abrangeu 1626 indivíduos de cinco categorias diferentes: desempregados, estudantes, profissionais de saúde, reformados e outras profissões. O estudo concluiu que os estudantes e os desempregados são aqueles que apresentam mais sintomas depressivos, inclusive maior dificuldade em dormir.



De um dia para o outro, os estudantes tiveram de se adaptar a um ensino à distância que implicou, desde muito cedo, um aumento do número de horas em frente a um ecrã e como consequência disso um maior cansaço a nível psicológico. É certo e sabido, que o espaço universitário e toda a sua envolvência é tido como um espaço de experiências novas e entusiasmantes para todos. A faculdade além de representar uma instituição de ensino, carrega há muito a crença de ser um espaço de partilha entre alunos, de convívio, de festa e de muitas aventuras que ficam na memória dos estudantes, para mais tarde poderem ser recordadas. A pandemia privou todos os estudantes desta experiência académica. Mas pior que isso, atrevo-me a dizer que, dificultou ainda mais todo o processo universitário e a pressão que todos os estudantes sentem ao longo dos três anos da licenciatura. Não foram só as horas em frente ao ecrã que aumentaram, foram também os trabalhos de grupo, os exames finais e as pesquisas que passaram a ser feitas, somente, através de um ecrã de um computador ou de um telemóvel. Não houve uma preocupação em perceber de que forma os alunos se adaptaram a esta nova fase das suas vidas, onde o contacto físico e social foi totalmente radicalizado e o seu espaço de trabalho foi reduzido a 4 paredes onde, única e exclusivamente, o contacto que os estudantes têm com os professores e colegas foi reduzido ao online. Além disso, as incertezas em relação ao futuro profissional aumentaram, significativamente. Os recém-licenciados terminaram a sua licenciatura em casa, sem qualquer contacto com o mercado de trabalho e sem qualquer perspetiva de futuro. Já para não mencionar as preocupações financeiras que são uma constante. As licenciaturas têm um preço, independentemente da universidade, todas têm um custo e esses custos não foram reduzidos, tal como o preço das casas que muitos estudantes alugaram no início do ano e que tinham de ser pagas nos restantes meses. Mas, infelizmente, não se ficam por aqui as preocupações. Fora do mundo académico, todos temos uma vida social, junto da família, amigos, colegas. Tudo isso ficou estagnado no tempo, vimos os contactos serem limitados, vimo-nos privados de estar com os nossos tios, avós, primos, amigos, namorados. Acabámos por perder a liberdade. Liberdade de ser, existir e viver. Como este texto mostra estamos todos no mesmo mar, talvez em barcos diferentes e queremos ou pelo menos acreditamos piamente, que em breve chegaremos ao destino. Mas até lá só nos resta esperar e pedir ajuda, não somos menos por isso, muito pelo contrário: somos mais e melhores, porque nos ajudamos a nós e podemos estar a ajudar os outros com a partilha sincera destes sentimentos que tanto nos têm perseguido nestes últimos tempos.


Dado o impacto que a pandemia está a ter na saúde mental dos universitários, a maioria das universidades reforçaram o apoio psicológico e, por isso, disponibilizaram consultas gratuitas de psicologia. Se és estudante informa-te junto da tua faculdade ou escola sobre o serviço de psicologia. Mas esta não é a única ajuda a que podes recorrer: a linha SOS estudante é uma linha de apoio emocional e de prevenção ao suicídio que funciona diariamente, via zoom, entre as 22h e a 1h da manhã, privilegiando o anonimato do aluno, se assim o preferir.


Linhas de apoio psicológico – Contactos:

Governo e Ordem dos psicólogos – 808 24 24 24

SOS Voz Amiga – 213 544 545/ 912 802 669/ 963 524 660

Sociedade Portuguesa de Psicanálise - 300 051 920

Linha Conversa Amiga – 808 237 327/ 210 027 159

Sociedade Portuguesa de Terapia Familiar – 213 555 193







- por Beatriz Pereira - 18 fevereiro 2021 em Sociedade

 
 
 

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